Fasci Italiani del’ Estero, na Itália,
no Brasil e em São José do Rio Pardo

O declínio do fascismo em São José e notícias da guerra

Em 1942, o navio brasileiro "Taubaté" foi metralhado por um avião alemão em águas do Mediterrâneo, e cinco outros navios brasileiros também foram bombardeados entre fevereiro e março de 1942.

Em 11 de março de 1942, mais um vapor foi bombardeado, indo a pique: o Cairu. Comoção nacional.

Naquele dia, em São José, o Cine Colombo exibia um comentadíssimo filme, com casa cheia. Entre a assistência, muitos italianos e o casal alemão, Luísa e Francisco Exner. De repente as luzes acenderam-se e o filme foi interrompido. Uma autoridade subiu ao palco e relatou o bombardeio, o afundamento do navio e o desaparecimento de 53 tripulantes, culpando o eixo, seus dirigentes e os fascistas pelo doloroso acontecimento. Comovido, cobria de luto o Brasil, dizendo que em respeito às dores e às lágrimas do País, a sessão não deveria prosseguir...

Em silêncio, todos saíram olhando com desprezo, mas sem ofensas, os italianos e alemães que, apressados, abandonavam o "Colombo".

 

 

Os amigos ...Bello, Domingos Bello e Lourenço Landini.

 

 

 

Em 11 de março de 1942, grandes manifestações populares intimidaram italianos, alemães, japoneses e seus descendentes residentes no Brasil. Em Vitória, a multidão depredou um bar alemão e a agência da Bayer. Em Florianópolis, foram atacados habitantes e residências. No Rio de Janeiro, a UNE (União Nacional dos Estudantes) ocupou a sede do Clube Germânia...

O governo brasileiro tomou medidas contra o Eixo: restringiu as atividades de cidadãos italianos, alemães e japoneses, responsabilizando-os pelas indenizações de guerra: teriam de reparar os prejuízos. Eis o decreto:

"Considerando que atos de guerra são praticados contra o continente americano; considerando que ao passo que o Brasil respeitava, com máxima exatidão e lealdade as regras da neutralidade universal, aceitas do Direito Internacional, o navio de guerra Taubaté foi atacado no mar Mediterrâneo, por forças de guerra da Alemanha; considerando que, assumindo solenemente a obrigação de reparar o dano causado por este ato, o Governo alemão até hoje não cumpriu este compromisso; considerando que (...) unidades desarmadas da Marinha Mercante brasileira, viajando com fins de comércio pacífico, foram atacadas e afundadas (...); considerando que tais atos constituem uma agressão não provocada (...) decreta que os bens e direitos dos súditos alemães, japoneses e italianos, pessoas físicas ou jurídicas, respondam pelo prejuízo que, para os bens e direitos do Estado brasileiro, e para a vida, os bens e os direitos das pessoas jurídicas ou físicas brasileiras, domiciliadas ou residentes no Brasil, resultaram ou resultam, de atos de agressão praticados pela Alemanha, pelo Japão e pela Itália".

Em São José do Rio Pardo, não fugindo à regra, os bens dos muitos italianos e de um alemão foram confiscados, como confiscada foi a sede do "Fasci Italiani del’Estero".

Notícias jornalísticas comentavam as ações de espiões, conhecidos como "quinta-colunas", que ajudavam os inimigos, transmitindo-lhes os movimentos dos navios, orientando a ação dos submarinos alemães. Nilo Cristennsen foi condenado a trinta anos por ter transmitido do Brasil a rota do "Queen Mary", que transportava tropas para o norte da África. Interditadas foram as duas empresas aéreas: a Condor (alemã) e a LATI (italiana).

A UNE liderou uma passeata de milhares de pessoas no Rio de Janeiro, em 4 de julho de 1942.

Em 18 de agosto, milhares de pessoas, nas ruas do Rio, exigiam represálias contra os alemães, pedindo veementemente que o Brasil entrasse na guerra, contra o fascismo, ao lado dos aliados. O mesmo ocorreu nas outras capitais brasileiras.

Em São Paulo, estudantes de Direito, realizaram um enorme comício na praça da Sé.

Em São José do Rio Pardo, muita gente se reuniu na Praça XV, em frente à Matriz, num grande comício, com muitos e inflamados discursos, inclusive de jovens estudantes, com palavras de ordem contra o Eixo e seus seguidores... Depois do comício, ainda com o ardor da manifestação, alguns estudantes, liderados por outros de fora, universitários, resolveram visitar e importunar temerosos e retraídos italianos, na esperança de encontrar um rádio que transmitisse mensagens aos inimigos, ou símbolos fascistas.

Aos gritos, entraram na casa antiga de duas irmãs italianas, de meia idade, solteiras, que cuidavam da velha mãe, à Rua João Pessoa (hoje, Francisquinho Dias), próxima à Matriz, que quase desmaiaram de susto. As paredes estavam cobertas com grandes retratos de seus ancestrais, alguns idosos fardados, tidos pelos jovens estudantes como fascistas. Começaram a desprendê-los dos pregos para levá-los e destruí-los na praça, enquanto outros desceram ao porão, imaginando descobrir rádios, ou uma rede transmissora naquele esconderijo. As duas senhoras, refeitas do susto, vestiram-se de coragem e enfrentaram os jovens, gritando, transmitindo-lhes lições de moral, de respeito ao patrimônio alheio, aos mais velhos indiferentes às atrocidades da guerra. Esclareceram que os soldados dos retratos eram "carabinieri" italianos, que atuaram na Itália antes de Mussolini nascer... Desapontados, os jovens saíram, mas, um deles, jogou com violência um dos quadros ao chão, estilhaçando o vidro protetor...

Nessa quadra de atemorizar os falsos quinta-colunas, até uma tocha esculpida no mármore, em um túmulo de uma família italiana (Perrella), foi arrancada e quebrada, confundida com um símbolo fascista.

 


Anos 30
Reunião de um grupo de italianos fascistas. Poucos identificados: atrás do menino de camisa branca está Lourenço Landini, de óculos, e ao lado do garoto, com palheta na mão está Dr. Adolfo Bacci. Na fila do meio, o 1º à esquerda é Luiz Greco e o 2º é Jacinto Parisi. Na fila de trás, o 3º é Domingos Bello e o penúltimo de terno claro e braços cruzados é Salvador Artese.

 

Policiais foram ao "Charque" do gentil alemão Francisco Exner, um sítio que cheirava a perfumados temperos, exalados da fábrica de mortadelas, de salsichas, de salames... Pediram-lhe desculpas por ter de cumprir o dever de vistoriar a casa e demais dependências. No final, o Sr. Exner entregou-lhes a espingarda, a única arma que possuía, por morar no mato... (Depois da Guerra, a arma foi-lhe devolvida).

 

 

Anos 20. No trole parado na Avenida Euclides da Cunha estão: José Perri, n.i. e César Mazzini. O cocheiro não foi identificado.

 

 

Dia 31 de agosto de 1942, o Governo brasileiro declarou guerra ao Eixo.

Aos 2 de setembro, mais de cem mil pessoas participaram da grande manifestação no Rio.

Em 7 de setembro, bombas-relógio foram espalhadas pelas ruas do Rio de Janeiro. Centenas de pessoas ligadas ao Eixo foram presas.

Em São José, os poucos italianos que possuíam um aparelho de rádio foram visitados pela polícia, que confiscou o aparelho, devolvidos depois de terminada a 2ª Guerra Mundial.

Temerosos, os italianos destruíram tudo o que pudesse condená-los como atuantes fascistas: cartas, retratos do Duce, do Rei e de comemorações, faixas tricolores, distintivos, livros de atas da Sociedade Italiana... O senhor Giuseppe Liberalli conseguiu esconder o primeiro livro da "Società di Mutuo Soccorso 20 Settembre": uma preciosidade, hoje, no arquivo do Centro Cultural Ítalo-Brasileiro. Algumas fotos foram poupadas do fogo...

Os feixes de varas, símbolos do fascismo, que, em relevo, decoravam o alto e as laterais do prédio do Fascio, foram demolidos, por ordens superiores.

 


Início dos anos 40
Respeitando ordem superior, os símbolos fascistas (o feixe de varas amarradas, ladeado por um machado) da fachada da "Casa d’ Itália" são arrebentados.

 


Esqueceram-se de apagar os quatro feixes que decoram o forro do salão de festas, que continuam na decoração até hoje (1999).


O armazém e casa de Giuseppe Cappello, em Paula Lima (Bairro Fartura), onde os italianos fascistas se encontravam.

 

Esqueceram-se de retirar os feixes em relevo do forro do salão nobre que, até hoje, lá estão, ligando-nos à arte e a tradições culturais passadas e sepultadas...

Mesmo temerosos e em segredo, pretextando jantar, um grupo fascista do "Fasci Italiani" rio-pardense ia a Paula Lima, ao armazém do Cappello, onde um rádio estava bem escondido num quarto dos fundos da grande casa. Atualizavam-se do movimento bélico mundial, demons-trando uma grande tristeza com as derrotas dos italianos na Grécia e na África, que facilitaram a entrada dos aliados na Sicília, em 1943.

Em maio de 1943, em São José, uma passeata comemorava esta derrota do Eixo, no Norte da África.

E mais tristes, ainda, ficaram os roxos fascistas quando o líder Mussolini, no fatídico 1943, foi deposto do governo, substituído pelo marechal Badoglio.

Os italianos discretamente recolhiam-se, mas o preconceito era notório. Seus filhos chegavam da escola, às vezes chorando, porque eram chamados de "ïtalianinhos", um diminutivo que tinha muito de pejorativo. Envergonhavam-se. Queriam ser brasileiros!

A jovem e bela Mercedes, brasileira, mas filha de italianos, noiva de um jovem de família portuguesa, quase desistiu do casamento porque o noivo era importunado pelas irmãs, que, até no dia do enlace, tentavam dissuadi-lo de se casar com uma "italianinha"...

A Guerra terminou em setembro de 1945.

Mussolini foi preso pelos próprios fascistas e executado em Milão, ao lado da amante Clara Petacci.

Em 1946, o rei Vittorio Emanuele III, no poder desde 1900, abdicou em favor de seu filho Umberto II. Três semanas depois, um plebiscito decidiu pela implantação da República. A família real deixou o país...

Aos poucos, o fraterno convívio voltou à cidadezinha de Rio Pardo..

 


1951 -  Família Merli
Bodas de Ouro do casal Pedro Merli e Natalina Biaco Merli,
ladeando o Padre Adauto Vitali. Na foto, com 72 pessoas, estão os 9 filhos do casal homenageado, netos e bisnetos.

 

 

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