RETRATINHOS DO BRASIL

 

TEM MÃE, SIM

            Não pense que é impressão sua. Você abre um jornal ou revista, liga o rádio ou a televisão e pensa sempre ter caído num programa policial: sabe notícias de falcatruas, desvio de dinheiro público, enriquecimento ilícito. A teia da corrupção está mesmo se expandindo e ficando cada vez mais forte. Se some  a verba da  merenda em Alagoas e prefeitos são presos; se em Rondônia um propinoduto revolta o povo de ; se no Rio de Janeiro uma juíza de coragem declara inelegíveis a governadora e o seu marido Garotinho; se em Brasília se procura por todos os meios impedir a constituição de uma CPI para apurar os escândalos dos Correios, – tudo demonstra que a sociedade brasileira   está criando coragem de acabar com tamanha roubalheira. Ou então ficando mais cínica em face de tanta irregularidade sem punições para seus beneficiários.

Um historiador, acadêmico e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – José Murilo de Carvalho – dá o nome da mãe de todos  os males: a impunidade. E lembra uma frase atribuída a Rui Barbosa: “Ou nos locupletamos todos ou instaure-se a moralidade pública”.

Nunca li isso em Rui, mas locupletar-se quer dizer tirar proveito, ficar rico.

 

MAIS UM FILÓSOFO

O mais antigo caminhador do Movimento dos Sem-Terra (MST) chama-se Luís Beltrame de Castro, tem 96 anosvisões muito particulares sobre quase tudo. Vejamos se não:

* Tenho oito filhos, quarenta e sete netos, sessenta e quatro bisnetos e oito tataranetos. Se minha terra for dividida entre todos eles, fica nada para cada um. O que minha família precisa é da reforma agrária ao contrário.

* O João Goulart quis botar a reforma agrária . Mas exportaram ele pra outro país.

* O MST é uma conjuntura. Isso quer dizer que é uma sociedade conjunta.

* Nunca quis fazer dentadura. Dente não faz falta. O que sobrou, arranquei com a unha.

 

OPINIÃO RADICAL

Achei muito estranho, numa Bienal de São Paulo, o que mais se comprava de livros. Eram de auto-ajuda, de receitas culinárias, de biografias superficiais e sensacionalistas. Nos infantis de mais sucesso   predominavam ilustrações coloridas ou  coisas para armar: casas, jardins, paisagens...

            Agora, no Rio de Janeiro, realizou-se a 12.ª Bienal do Livro e o crítico Sérgio Augusto, ele próprio um bom escritor, não faz dela balanço muito favorável. Escreve ele que no primeiro dia da mostra, mais de cem mil pessoas  lotaram o Riocentro em busca de promoções, de escritores de obras muito vendidas, de celebridades. No entanto, palestras de autores conhecidos por suas qualidades literárias permaneceram sem público.

            Conclusão dele: a Bienal do Livro do Rio não passou de uma quermesse de celebridades. Ela foi apenas uma vitrine do interesse fugaz do brasileiro pelo mundo literário.

            Aditamento meu: o que mais atraiu o público no último dia da Bienal foi o elenco da novela ao estilo mexicano Maribella (ou coisa assim) , da Rede Bandeirantes!

 

CONFISSÃO PÚBLICA

O senador piauiense conhecido como Mão Santa ( foi governador do estado) assim justifica o fato de haver apoiado Lula na última eleição: “Não votei nele por três vezes. Mas na quarta, o cão (diabo) me atentou demais e eu não resisti”.

E na próxima quem vencerá – sua força de vontade ou o cão e suas artimanhas?

 

POLITICAMENTE CORRETO

Não vingou o lançamento  da cartilha que seria patrocinada pela Secretaria dos Direitos Humanos, em que se arrolam as palavras e expressões incompatíveis com nossa discutível democracia racial. O presidente Lula protestou contra a inclusão de um de seus termos prediletos na designação do trabalhador, do homem comum: peão. Uma palavra como negro jamais poderia ser usada, porque considerada ofensiva. Lembram-se do caso recente provocado pelo jogador são-paulino Grafite, ofendido em campo por um incauto defensor argentino que acabou pegando uns dias de cadeia e um susto para não se esquecer jamais? Logo quemum futebolista que aceitou de bom grado ter por apelido Grafite. Ora, pois!

            Uma telespectadora da TV Senado (há quem veja esse canal e ainda ouça a Rádio Senado em onda curta!) mandou para uma sugestão quando menos criativa. Um dos ambientes mais bonitos do Congresso Nacional chama-se Salão Negro. A tal telespectadora, em nome do politicamente correto, propõe a mudança de seu nome para Salão Afrodescendente... Brasileiro brinca com tudo.

 

            JOGO DE PALAVRAS

Pensamento falsamente posto na cuca e na boca de  Ronaldo, o fenômeno: Antes, eu dizia “eu te amo, Daniela”. Agora posso dizerque se dane ela”!

Belo resumo atribuído ao sanfoneiro Dominguinhos: “Com aquela boca, a Daniela Cicarelli deveria ter se casado com Mick Jagger”.

            É olhar as fotos dos dois envolvidos e dar inteira razão ao maior discípulo de Luís Gonzaga.

 

 

 AMIGO QUE  VAI

Surpreendeu-me o número de pessoas presentes no velório e no sepultamento de Mário Maríngolo. Ele não era o que se poderia classificar de pessoa de fácil trato. Radical, intransigente, críticotudo isso é verdade. Mas o convívio com ele valia por uma permanente comprovação de probidade, de pensamento retilíneo.

Não antiga a nossa amizade, levando-se em conta as nossas idades. Passamos a conversar e a nos entender por causa de nosso  interesse pela revista A Recreativa, tão rica em dificuldades nas palavras cruzadas sem chaves, nos grifogramas, nos rébus.  Nós nos consultávamos sempre e com  espírito fraterno conseguimos resolver problemas que por vezes superavam as nossas possibilidades pessoais.

O Centro Cultural Batista Folharini, nosso ponto de convívio, fica mais pobre com sua partida, claramente  prenunciada desde a morte, há pouco mais de um ano, de sua esposa D. Lúcia.

 

28/05/2005
(emelauria@uol.com.br)

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