Corinthians, Massa e a velha senhora

 

DESDE QUANDO O GLORIOSO Sport Club Corinthians Paulista ganhou um torneio esquisitíssimo que lhe valeu o contestado  título de campeão mundial interclubes, tenho evitado tocar no assunto futebol. Só abri exceções para comentar alguns acertos e muitos erros da Seleção Brasileira, afinal de contas a Pátria em chuteiras, na deliciosa definição de Nélson Rodrigues.

Escrevi mesmo um longo artigo chamado “Corinthians, adeus”, em que me desobrigava de cultivar a  ligação afetiva iniciada quando, na flor de meus sete anos, eu ganhara de um primo nada menos do que vistoso distintivo, daqueles de se usar na lapela. Aquele distintivo com uma âncora e dois remos que mais lembram vocação para esportes náuticos do que para o chamado “nobre esporte bretão”.

Depois do tal título, ainda algumas boas surpresas, como a conquista de um campeonato paulista e de outro brasileiro, mas preferi não dizer palavra a respeito, mesmo porque já estava vigorando uma estranha parceria entre o clube e uma organização internacional acusada de lavagem de dinheiro. Além do mais, houve a invasão argentina, com Passarella, Tévez e companhia bela.

Lá se foi água abaixo um dos apanágios do velho clube – o de não contratar estrangeiros, porque era “do Brasil o clube mais brasileiro”, conforme continua explicitando o seu hino. Bem que já tinha havido uns alienígenas no time, mas a arrogante invasão argentina foi demais para meu gosto.

Vai daí que os tempos mudaram, o clube se afundou em escândalos,  dívidas e em maus resultados, correndo agora o sério risco (68% de possibilidades, nesta quarta-feira, 24 de outubro) de cair para a série B do campeonato brasileiro. Risco tão sério, que os jornais de ontem  trazem com destaque a recepção  dada, no palácio do Planalto,  pelo presidente Lula a um grupo de jogadores que participaram da conquista do campeonato paulista de 1977. Tinham sido vinte e três anos de penosa fila, cujo principal responsável fora Pelé, nosso algoz de tanto tempo. Basílio, o autor do gol no dramático jogo contra a Ponte Preta, entregou a Lula a camisa comemorativa daquele grande feito, que lavou a alma de milhões de torcedores espalhados por todo o Brasil. O presidente, corinthiano confesso (ninguém é perfeito!), exortou os jogadores e os dirigentes a evitar o rebaixamento. Está difícil, mas não impossível: basta conquistar doze pontos nos últimos seis jogos faltantes... Com esse timinho aí, não sei não.

Enquanto isso, à semelhança do leão velho da fábula, nós corinthianos estamos sofrendo com o máximo de paciência  todo tipo de provocações, especialmente de são-paulinos e palestrinos, esquecidos de que as coisas mudam...

Então agora é preciso ficar bem claro: talvez a queda para a segundona  seja o elemento catártico que levará o Corinthians à purgação de seus males e ao reencontro com o melhor de suas tradições, que é vencer muito mais pelo empenho, pela garra do que pelo apuro técnico. Afinal de contas, o lateral Idário, o centroavante Baltasar, figuras lendárias pelo amor à camisa, nada tinham de craques consumados, como o ponta Cláudio, o meia Rivelino. Estavam mais para cabeças-de-bagre do que para virtuosos no trato com a bola, mas tinham coração animoso e pulmões em boa forma.

Grandes times desceram e logo depois subiram, cheios de brio. Aí estão de volta o Palmeiras, o Grêmio Porto-Alegrense, o Botafogo do Rio de Janeiro.

Quem sabe disputar jogos com transmissão pela Rede Vida  não seja o necessário banho lustral para que o SCCP reconquiste a  força moral de    comemorar com a maior dignidade o seu centenário de fundação, no cada vez mais próximo ano de 2010?

FAZIA MUITO TEMPO que não se via alguém de cara mais amarrada na hora do triunfo do que o nosso corredor de fórmula-um Felipe Massa, obrigado pelo espírito de equipe a abrir espaço a seu companheiro de Ferrari – Kimmi Raikkonen – no Grande Prêmio do Brasil. Massa bem sabe como é que os brasileiros pensam a respeito de conquistar o segundo lugar numa competição: é quase o mesmo que chegar em último. Para os brasileiros, vice não é nada.

Claúdio Lessa, tarimbadíssimo jornalista de vivência internacional, não tem dúvida em anunciar aos quatro ventos que o resultado do campeonato mundial de automobilismo de 2007 não passou de enorme pizza temperada e assada no capricho.

Depois daquele imbróglio entre a McLaren e a Ferrari, comprovada a culpa da McLaren  no espionar a rival, o que deveria acontecer seria a perda de pontos dos pilotos da culpada. Mas era necessário dar-se um melhor fim ao drama, porque o campeonato de 2006 estava sendo encerrado com muita expectativa, com recorde de bilheteria, com audiência de tevê nas alturas e com a necessária preservação da imagem da disputa como sendo algo lícito, sem sinal de marmelada.

Que fazer?  Segundo Cláudio Lessa, uma complicada armação, com a anuência de todos os envolvidos, capaz de explicar as trapalhadas do hábil piloto Hamilton nas duas últimas disputas. Na penúltima prova, a barbeiragem de atolar o carro na brita. Em Interlagos, misteriosa “falha eletrônica” na sua máquina. E o companheiro de equipe, o lutador Alonso, perdendo de repente toda a sua força competitiva.

Com os pilotos da McLaren cumprindo a rigor esses papéis tão tristes de entregar o mais discretamente possível o ouro do título, o resto ficaria, como ficou, por conta da Ferrari. Massa dando espetáculo de competência, mas na hora combinada cedendo a honra do primeiro lugar  ao companheiro Raikkonen. Vitória do finlandês não só naquela prova, mas no próprio campeonato. Não terá sido  esta a primeira vez em que um piloto se vê compelido a facilitar as coisas para um colega de equipe. Essa, aliás, a grande queixa de Rubinho Barrichello na mesma Ferrari. Não poucas vezes, teve de correr de acordo com as conveniências da escuderia, que privilegiava escancaradamente o colega Schumacher. 

Vitórias do jogo de equipe. Vitórias dos arranjos...

Algum leitor que tenha chegado até aqui estranhará os dois assuntos que desenvolvi hoje. Os dois fogem ao comum de meus temas e de minhas preocupações, mas têm muita relação entre si.

Quem sabe não se encontra uma solução pra lá de miraculosa  na difícil situação do Corinthians?

Quem sabe nós todos não  estamos sendo assim ludibriados em outros assuntos de  alcance local, regional ou nacional?

O poder, em todos os seus aspectos, leva os seus detentores a manobras que espantariam o comum das pessoas, feitas apenas massa de manobra  na complicada urdidura das teias do interesses pessoais e grupais.

Viver está cada vez mais perigoso.

ACHEI EXAGERADA A COBERTURA dada ao recente casamento, na Argentina, de uma mulher muito velha com um homem muito moço. Pensei que, passada a novidade da notícia, o desarmonioso casal se perdesse  no geral anonimato e fosse, dentro do possível, cuidar da vidinha deles.

Pois não é que no começo da semana  vem outra novidade? A idosa recém-casada morreu. Logo se abriu a temporada das conjecturas, quase todas resumidas na frase maliciosa --  ela não agüentou o tranco e entregou os pontos. O mais comum nesses casamentos incomuns é que o homem não resista e seja vítima do que se chama  operação mata o velho.

 Tomara que a causa mortis tenha sido apenas a emoção de viver um efêmero e fogoso amor e que não se descubra nenhum traço de dolo por parte do jovem viúvo, quem sabe de olho na fortuna da corajosa noivinha.

 

27/10/2007
(emelauria@uol.com.br)

 

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