Por
causa
da
medalha
Injusto e
indelicado seria
deixar
passar
sem
referência
tudo o
que recebi
por
causa da
Medalha
Germinal Artese. Foram
telefonemas,
telegramas,
e-mails,
mensagens de
viva
voz,
presença
física no
dia da
entrega... A
todos e a
cada
um,
meu
profundo agradecimento.
Difícil uma
solenidade
como a de 17 de
março à
noite, na
Fábrica de
Expressão.
Com o
aguaceiro caindo e a
quinta-feira de
trabalho
para
tantos, imaginei
que
bem poucas
pessoas poderiam
ir
até
lá,
ou
para
presenciar a
homenagem a
mim prestada
ou
ouvir a boa
música do
conjunto de
chorões de
Tatuí – Quebrando o
Galho. Enganei-me
redondamente: o
auditório estava
cheio, e
em
sua
grande
maioria as
presenças eram devidas a
laços de
amizade, de
coleguismo, de
parentesco.
Também
notável numa
sessão
em
que
tantos falaram,
não
ter havido
nenhum
excesso, nenhuma
impropriedade.
Pois foi essa
perfeição
verbal o
que se deu naquela
memorável
noite:
ninguém perdeu o
senso da
medida. João Santurbano, Maurilinho, Lúcia,
Agenor, Osmar, Marly –
todos deram
seus
recados
com
precisão de
impressionar.
Vi-me
apanhado numa
amistosa
armadilha,
como foi a
surpresa
preparada
por Lúcia Vitto,
com a
cumplicidade de Marly Terciotti e de Osmar
Aparecido Mendes e o
dedo selecionador de Paulo Herculano. Tive de
reconhecer de
público,
para
não
cometer
injustiça
com os
três
leitores,
que os
meus
textos, interpretados
emocionalmente
por
eles, ficaram
muito
significativos. Na
hora, lembrei-me de uma
observação
que o
velho
Machado colocou na
boca de
um
personagem
adolescente da “Missa
do
Galo”: Conceição,
que
era
apenas
simpática, ficou
linda, lindíssima...
Assim fizeram
eles
com
meus
textos escolhidos
pelo Paulinho: de razoavelmente
escritos, passaram a
lindos, lindíssimos.
Vozes amigas deram-lhes
incomum colorido e
profundo
significado.
Maurílio Edson Bazilli,
estreante
como diretor-presidente do
Departamento de
Esporte e
Cultura, voltou
muitos
anos
em
sua
vida e se colocou na
situação de
aluno
meu,
mais do
que
isso, de
aluno agradecido. Agenor
Ribeiro
Neto a
meu
respeito deixou
também
falar o
coração. O
prefeito João Santurbano expressou-se
pela
cidade, de
modo
amistoso e
estimulante.
Estava
eu,
portanto,
mais do
que
falado naquela
noite. Cabia-me, à
vista disso,
avivar
para a
geral
lembrança a
figura do
patrono da
Medalha,
um
professor
que
tinha
feito as
delícias e os sofrimentos de
tantos de
nós,
ali reunidos num
preito de
reconhecimento e rememoração.
Enquanto
eu falava de
Germinal Artese, trazendo
traços de
sua
figura, as
suas
concepções artísticas, a
competência, as
tiradas do
velho
mestre de
Desenho, podia
ver no
auditório o assentimento e a
concordância emocionada de
quem havia sido
seu
aluno.
Não eram
poucos,
embora a
carreira
profissional dele houvesse terminado
por
volta de 1973.
Procurei
valorizar a
probidade
profissional, a
dedicação ao
trabalho, a
incontestável
habilidade do
desenhista, do
paisagista
minucioso...
Claro,
também trouxe à
memória
sua
ironia
por
vezes
cortante, a
sua
verve
cáustica, as
suas
observações ferinas,
quer de
viva
voz,
quer
em
textos
que
ele redigia
para a
Resenha, o
combativo
jornal
sem
data
muito
certa
para
sair, de
responsabilidade do
pai, o
jornalista Paschoal Artese.
Fiquei
receoso de
acabar cansando o
auditório e resumi
quanto pude o
meu
elogio
acadêmico ao
patrono da
comenda
que
eu recebia.
Sou de uma
geração
que teve
muita
sorte
com
seus
professores,
tanto do
ensino
primário,
quanto do
secundário e
normal.
Por
vezes, ao
tentar
localizar
onde é
que aprendi
tal
ou
qual
conceito, acabo dando
com a
figura de
um deles,
que encontraram
em
mim o
aluno
disposto a
assimilar o
máximo, a
incorporar
pela
vida
toda o
que de
fato
valia a
pena
assimilar. É
exatamente desta
falta de
capacidade de
fixação
que se queixam
hoje
educadores de
todos os
níveis. Parece
que as
pessoas recebem
tanta
informação,
especialmente de
fora da
escola,
que ao
fim
nada de
importante cabe na
memória de
cada
um. Tenho,
como
professor, o
testemunho de
não
poucos
alunos
que guardam a
meu
respeito a
mesma
consideração
que tenho
com
meus
antigos
mestres.
Isso é
animador e
compensador,
aliás uma das
maiores
compensações do
magistério.
Nunca fui dos
alunos
com
especial
pendor
para o
desenho. Cumpria
com
seriedade
minhas
obrigações, fazia
minhas
gregas
simples e compostas,
minhas
faixas decorativas; estilizava
minhas
flores; aprendi
algo do
desenho do
natural; assimilei as
regras da
perspectiva, de
estabelecer a
linha de
terra, o
ponto de
fuga.
Nada
que
me envergonhasse,
nada
que
me distinguisse.
Nunca fiquei
para a
segunda
época,
mas
também
nunca vi uma
nota
nove
ou
dez. Lembro-me do
capricho dos
colegas,
especialmente do
Científico,
que manejavam
com
arte e
precisão
régua,
esquadro,
compasso,
transferidor de
ângulos e enveredavam
pelo
mundo
abstrato do
desenho
geométrico, do
desenho projetivo.
Dentre
esses
desenhistas, Walter Bergamasco,
que se formou
arquiteto no
Rio de
Janeiro e
que está
até
hoje
entre
nós,
vivo e
são; Mário Gonçalves,
engenheiro
atuante
em Guaxupé; William Russo, de
outra
cidade
mineira,
mais
distante,
talvez Itamoji; Râmisa Jorge,
brilhante professora de
Matemática. Tinham
todos
estes
muita
admiração
pelo Prof.
Germinal e mereciam dele
generosa
atenção.
Não tive
como
falar disso
tudo na
entrega da
medalha,
como
também omiti algumas deliciosas
histórias envolvendo o
professor, algumas
publicáveis, outras
nem
tanto. Gostaria de
ter relatado,
como
exemplo da
presteza
mental de
Germinal Artese,
passagens
como esta:
Um
dia, na
sala dos
professores do “Euclides da
Cunha”, o Prof.
Germinal esbravejava,
com uma
página da
Gazeta do
Rio
Pardo na
mão.
-- Veja esta
notícia...
E
eu li: Ia
ser
aberta uma
exposição de
artesanato,
mas esta
palavra havia
saído
com
um
erro de
imprensa: artesenato...
--
Isso é
falso,
muito
falso. O
verdadeiro Artese
nato nesta
cidade sou
eu...
Como
esquecer a
sua
tirada demolidora
quando uma
aluna da
Escola
Normal,
quase
apanhada colando, sentou-se
em
cima de
seu
caderno de
desenho
pedagógico?
--
Senhorita,
não é
por
aí
que entra a
sabedoria...
Dionísio Guedes
Barreto,
prefeito municipal no
início dos
anos 50, mostrou-me
lá
por 1990
um
tétrico
desenho de
Germinal, combatendo a
instalação de uma
estação de captação de
água do
rio
Pardo,
logo
atrás do
cemitério, num
local denominado
poço do
sargento:
um
cano de
esgoto jogava
suas
imundícies no
rio,
onde havia
penicos,
vasos
sanitários
quebrados,
detritos boiando, urubus
de
espreita. O
tema da
campanha de
Germinal e da
Resenha
era
que
com a
utilização da
água do
rio no abastecimento
urbano,
todos
nós tomaríamos
caldo de
defunto...
Uma
pessoa
muito
atenta e observadora comentou
depois da
sessão do
dia 17 de
março,
que
eu fizera a desconstrução da
biografia de
Germinal Artese.
Não foi esta a
minha
intenção. Quis
reviver a
figura de
um
artista consagrado
que
talvez se tivesse apegado
em
demasia ao
academicismo,
mas
nem
por
isso deixou
jamais de
ter
seus
méritos reconhecidos. Quis
também
ressaltar a
sua
atividade professoral ao
longo de
mais de trinta e
cinco
anos de
magistério.
Pelo
que tenho
ouvido no
decorrer da
semana, consegui
atingir
meus
objetivos e
rememorar
condignamente uma
significativa
figura da vida
artístico-cultural de
nossa
cidade.
26/03/2005
(emelauria@uol.com.br)
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