Recados de leitores
Têm sido particularmente numerosas as formas de retorno por parte de meus pacienciosos leitores a respeito de coisas que escrevo. Domingo passado, durante almoço no Centro Cultural Ítalo-Brasileiro, inesperado número de amigos se manifestou a respeito de meus mais recentes artigos – Estão todos bem e Para entender o amor. A começar pelo meu conviva mais próximo, o cônego Darcie, que se lembrou até do nome de meu afilhado Rosoel, cuja atitude foi muito apreciada. Nicinha Costa me disse que nas duas últimas semanas eu havia exagerado na dose de provocar emoções... Claro que nem pensei nesse propósito, ainda mais que Para entender o amor era repeteco de assunto já publicado há alguns anos. Rodolpho Del Guerra também fala sobre eles e sobre a necessidade que temos de republicar textos, porque escrevemos há muitíssimo tempo. “Tenho crônicas de cinquenta anos atrás que já ninguém recorda...” Pura verdade. Nosso público faz coisa pior do que esquecer: morre também... Alguém comenta que o DVD com o filme Estão todos bem faz sucesso e arranca lágrimas por aí. O mesmo vale para a versão americana com Robert de Niro – Everybody’s fine... Talvez por causa de tanta gente fiel na leitura é que não tenho medo de escrever artigos longos, muitos dos quais chegam, pela extensão, a desanimar pessoas mais acostumadas ao sintetismo nem sempre bem-sucedido dos orkuts e companhia bela. Perspicaz leitora me faz por e-mail a pergunta direta: o comentário sobre o filme do Mastroiani tem caráter autobiográfico? Respondo-lhe que não. Tem apenas, tanto para mim quanto para quem o vê, o indisfarçável caráter de advertência. É o que se chama função sintonizadora da arte. Tudo que vemos ou ouvimos tem elaboração certa em nosso cérebro, que transfere para as nossas situações individuais o que o filme, a tela, o livro ou o artigo expressa com base na realidade ou na ficção. Afinal, somos o centro de nossos pequenos mundos. Um meu solerte leitor, que não deixa escapar a mínima ocasião de me cutucar sobre crônicas publicadas e reaproveitadas, já me chamava a atenção, lá por 2007, bem no comecinho: “Belas histórias. Gostei do furto dos poemas. Pô, como as coisas somem por aí! Desde os cigarros do ano de 1968, quando o senhor deixou de fumar... Agora, poemas... Espero que, à vista de tantos desaparecimentos, tenha um belo cofre!” – Um exagerado, já se vê. Transcrevo duas pequenas mensagens, de bastante conteúdo, uma de São Paulo e outra de Franca:
1. Gostei muito de reler os dois textos, ambos belos e tocantes em sua expressão de humanidade. 2. Sensível. Fazem um bem danado essas coisas que você escreve. Imagino Marina, presença diáfana, levando-o a remexer e selecionar escritos, um dos quais tendo ela própria como personagem...
Duas leitoras se aprofundam em considerações que não posso deixar de compartilhar com meus amigos desta coluna. São reflexões maduras, adequadas, originais. Aquela que eu identificarei apenas por C, escreve: “Quem diria que 40 anos depois um Rosoel (que nome esquisito!) bateria à sua porta para lembrá-lo de uma velha história de amor e de reconciliação! Até achei que a reconciliação foi boa apenas para o Rosoel. Veja bem, aquela mulher alta, bem-feita de corpo, cabelos compridos, causou boa impressão ao advogado dativo (já ouvi essa expressão lá em casa, em tempos passados). Coitada, morreu atropelada, provavelmente numa daquelas ruas intransitáveis de São Paulo. O filho Rosoel, preconceituoso, achou que foi porque era muito surda e meio distraída. Se ele tinha razão, o que a vida fez àquela impressionante e corajosa mulher? Quanto ao pai do Rosoel, morreu de morte natural, provavelmente desgastado de tanto trabalhar para sustentar a família. Talvez tivesse vivido mais se tivesse continuado sendo folgado, trabalhando pouco e se divertindo muito... Talvez tenha sido nocauteado pela vida... [.....] Sobre a secretária do lar Sueli, a que gostava de poesia, que pena que casou com um homem que não a fazia sonhar nem entendia de poesia! De outra forma, teria cuidado dela e não a enchido de filhos. Teria, pelo menos, aproveitado os dons sensíveis da esposa e passado noites ouvindo sonetos e versos apaixonados, o que (muito provavelmente) a teria poupado de se tornar gorda e cansada da lida vida. Bem, infelizmente, é isso o que acontece quando não se entende o significado do amor. Sensível e carinhosa foi mesmo a dedicatória da amiga que deixou o coração inteirinho aqui em São José do Rio Pardo e um bom pedaço dele para a amiga Marina! Amizades assim, que pena que não existam mais. É a isso que se dá o nome de leitura crítica, praticada por quem não engole nada sem analisar item por item... É de São Paulo a outra leitora, que chamarei apenas de ML. Diz ela: Não me pesam ainda nas costas 70 aninhos, nem sou mãe de 4 ou 5 filhos espalhados por este mundo de Deus, nem tampouco desejo fazer-lhes uma visita, pois moram comigo. No entanto, o tema e a abordagem do filme tocaram-me profundamente, assim como acredito que de diferentes maneiras irá tocar outras pessoas que o assistirem, nas mais variadas idades e papéis familiares. Digo isso pois todos os personagens, principalmente o protagonista, nos remete em menor ou maior grau a aspectos e questões psicológicas que possuímos e com as quais nos identificamos. Isto configura a meu ver, um filme com a essência que esta arte tem: a de oferecer ao espectador a possibilidade de, ao olhar para o outro, olhar para si mesmo e ressignificar algumas questões, permitindo que não se saia incólume após assisti-lo. Sua crônica revela com fidelidade, a sensibilidade e a profundidade do filme. Nada, portanto, como ter leitores atentos, capazes, corajosos e autênticos! Numa atitude que pouco tem de exibicionismo e muito de intercâmbio, mandei a meus internautas mais chegados a foto da cabeça do meu retrato feito com tinta acrílica sobre tela pelo Ronaldo Bertacco. Não demoraram a chegar algumas mensagens bem-humoradas e cheias de subentendidos:
24/09/2010
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