Uma experiência esquecível: o Conselho Euclidiano

 

            Às vezes, por vontade de acertar, cometem-se erros de proposição cujas conseqüências perduram muito além do esperado. Deve haver, mesmo, um depósito extraterreno cheio de boas intenções.

            Foi minha a idéia da criação do Conselho Euclidiano, órgão de assessoramento gratuito à direção da Casa de Cultura Euclides da Cunha. Isto se deu há uns três ou quatro anos, quando o diretor da Casa era Álvaro Ribeiro de Oliveira Netto, que não poucas vezes se queixou de solidão no exercício do cargo, tendo em vista a falta de quadros funcionais adequados. Sempre que possível, eu o auxiliava individualmente, mas percebia como seria importante a existência de um órgão permanente que substituísse com vantagem a antiga Comissão de Festejos Euclidianos, criada pelo Dr. Oswaldo Galotti, nos anos quarenta.

            Diferentemente da Comissão, constituída por representantes de entidades e preocupada apenas com a Semana Euclidiana, o Conselho seria integrado por euclidianos capazes de contribuições expressivas, a qualquer tempo,  para a solução de questões euclidianas. Vale tanta redundância, porque a idéia central era essa: o Conselho Euclidiano trataria de questões euclidianas, não se envolvendo jamais em outros assuntos, fossem políticos, administrativos ou econômicos.

            Convidadas, aceitaram compor o Conselho pessoas com larga folha de serviços ao euclidianismo, como Rodolpho José Del Guerra e Cármen Trovatto Maschietto. De imediato foi lembrado o nome de Maria Olívia Garcia Ribeiro de Arruda, atuante professora do Ciclo de Estudos e pesquisadora do universo de Euclides da Cunha. Também vieram para o Conselho o Prof. Lando Lofrano, com larga experiência universitária; Paulo Herculano, jornalista e estudioso. Como pertencer ao Conselho pressupunha o preenchimento de qualidades pessoais permanentes, seria estranho pensar-se em determinar a duração do mandato de cada um. Uma vez conselheiro, conselheiro sempre, como é a tradição em academias e congêneres.

            Procurou-se dar às atividades do Conselho a máxima praticidade, sem lavratura de atas, sem eleição de dirigentes. Apenas informalmente é que fui indicado presidente.

            Com a não-confirmação de Álvaro Ribeiro de Oliveira Netto para a direção da Casa no segundo mandato do prefeito João Santurbano, deu-se o primeiro questionamento às boas intenções do Conselho, porque o ex-titular levantou pública suspeita de  interferência nossa na indicação da nova diretora, Ana Lúcia Dias de Souza Sernaglia. Precisou haver manifestação nossa em sentido contrário, mas na verdade aquela aura de isenção, indispensável à credibilidade do Conselho, ficou prejudicada.

            Provavelmente a nova diretora precisasse menos do Conselho do que seu antecessor. Em todo  caso, o Conselho tomou conhecimento de algumas inovações polêmicas na organização da Semana Euclidiana de 2005, como a transferência do desfile “de abertura” para o domingo, 7 de agosto, e a  drástica redução no número de participantes  da Maratona Intelectual Euclidiana. Era um crédito de confiança, a título experimental. Ficou evidente a existência de opiniões conflitantes  na validade dessas medidas, dentro do Conselho e fora dele.

            O  episódio policial do furto da cabeça de Euclides, que ficava no Mausoléu, mostrou com clareza como o Conselho era desimportante até para próprios integrantes seus, que se manifestaram através de opiniões pessoais.

            Na atividade comemorativa do aniversário da ponte de Euclides, a 18 de maio de 2006, o Conselho não se fez presente. Na reunião ocorrida dias depois, só dois conselheiros compareceram , além de mim e da diretora da Casa.. Foi escolhido o conferencista de 14 de agosto, sugeridos ao prefeito quatro novos nomes de conselheiros, apreciadas as melhorias efetuadas no térreo da Casa e encarecida a urgente necessidade de se atualizar o seu site na internet. No entanto, até  21 de junho de 2006, quando redijo esta matéria, ele ainda trazia  em sua página inicial notícias sobre a programação da Semana Euclidiana de 2005!

            Está latente o mal-estar de alguns conselheiros entre si e/ou com a diretora da Casa. Na Câmara Municipal, o vereador Luiz Paulo Cobra Monteiro, segundo publicação em artigo de Álvaro Ribeiro de Oliveira Netto, teria requerido ao prefeito informações a respeito do Conselho Euclidiano, sua constituição, duração do mandato de seus membros e cópia da ata da última reunião. Nunca me chegou às mãos nenhuma solicitação de informações nesse sentido.

            Ora, nada disso bate com as bem-intencionadas finalidades que imaginei para o Conselho. Recebo pela internet transcrições de opiniões de maratonistas, de professores do Ciclo e de entidades de algum modo ligadas ao euclidianismo. Todos têm queixas de alguém ou de alguma coisa. Vejo nisso tudo uma cobrança indevida ao Conselho, que não tem nem quer ter interferência em questões internas da Casa, assim como não toma partido entre as muitas tendências em que o euclidianismo parece estar fracionado. Há os que desejam o retorno de práticas antigas, não aceitas pela atual diretora; há os que temem pela perda das tradições euclidianas em seu aspecto ritualístico, folclórico e popular; há os que lutam pelo retorno de professores não convidados nas últimas Semanas; há os que põem a culpa de tudo no atual prefeito; há os que acham não haver o devido cuidado com os objetos e documentos do acervo euclidiano; há os que acham a Semana Euclidiana uma grande maçada. Num ponto parece existir unanimidade: a comunicação da Casa pelos meios eletrônicos precisa melhorar imediatamente, porque sem divulgação, nada que se faça tem chegado ao conhecimento dos mais interessados no assunto.

            Não vejo condições de superar dificuldades que nem competiriam ao Conselho, mesmo se ele estivesse coeso em todos os pontos de vista.  Por tudo isso, estou firmando uma posição pessoal, tanto quanto possível clara:

1.      Já não me considero presidente do Conselho, cargo a que não posso sequer renunciar porque não houve nomeação formal.

2.      Não dou as costas à Casa de Cultura Euclides da Cunha, cuja direção pode continuar a me solicitar a colaboração que tiver por necessária.

3.      Julgo indispensável para o êxito do trabalho da direção da Casa (cargo de indicação política) a criação de um bom quadro funcional, preenchido através de concurso público de provas e títulos. Um secretário-executivo com formação superior adequada; um bibliotecário com adequado conhecimento de documentação; digitadores competentes e com familiaridade no campo da informática; funcionários com capacidade de responder às perguntas formuladas por visitantes de bom nível. Só assim a Casa poderá desempenhar sua missão de centro cultural e de museu.

4.      Acredito que a permanência do movimento euclidiano em sua feição rio-pardense tem íntima ligação com o estímulo à pesquisa e docência em nível universitário. A direção da Casa, se contar com bons professores nos Ciclos de Estudos, além de competentes funcionários, terá os elementos que garantirão a perenidade de uma atividade cultural  sem paralelo no Brasil.

 

24/06/2006
(emelauria@uol.com.br)

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