Um romance à moda antiga

 


Joaquim Manuel de Macedo foi um médico, jornalista, político, professor, romancista, poeta,
teatrólogo e memorialista brasileiro. É o patrono da cadeira nº 20 da Academia Brasileira de Letras. (
Wikipédia)

 

 

Se não fossem as indicações de leitura obrigatória que tantos professores ainda fazem a seus indefesos alunos de sétima ou oitava série, acho que ninguém mais leria nem A moreninha nem qualquer outro livro do Dr. Joaquim Manuel de Macedo. Não que ele seja ruim escritor, os tempos e as expectativas é que mudaram. Ele mesmo não fazia grande juízo de si mesmo, a ponto de assim se descrever em As vítimas algozes: “Pobre escritor de acanhada inteligência, rude e simples romancista sem arte que somente escreve para o povo”.

A crítica posterior não o considera melhor: sem preocupação de mensagem, de sondagem da verdade, Joaquim Manuel de Macedo condicionou-se ao gosto popular de seu tempo – daí a falta de alcance, de perenidade de sua obra. Suas novelas repisam estrutura uniforme, com pequenas variantes, de tal forma que o enredo dos últimos romances lembra o dos primeiros. Não havendo progredido tecnicamente, suas singelas histórias de amor são eivadas de sentimentalismo, de lances românticos. Não deixam, porém, de fixar documentalmente a paisagem natural e social do Rio de Janeiro e sua sociedade pequeno-burguesa dos meados do século XIX. Estudantes, políticos, comerciantes, caixeiros, funcionários públicos, comadres, mucamas, alcoviteiras – eis aí suas personagens indefectíveis se relacionando na rua, nas festas públicas ou saraus familiares. O entrecho normalmente gira em torno de namoricos que não passam do portão da rua, ou, quando passam, acabam em casamento, com todas as formalidades de um noivado honesto, vigiado por irmãs solteironas e tias velhas, como resume Ronald de Carvalho.

O homem era bom em muita coisa, tanto no magistério (foi professor no Colégio Pedro II) quanto na vida acadêmica (sócio-fundador do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro), quanto ainda na política (deputado-geral).

Professor das princesas, filhas de D. Pedro II, Joaquim Manuel de Macedo, o Dr. Macedinho, desempenhava seu mandato de deputado e foi convidado a integrar o gabinete liberal que se formava em 1864. A ele estava destinada a pasta dos Negócios Estrangeiros, hoje Relações Exteriores.

Macedo recusou o convite com tal veemência, que o próprio imperador mandou chamá-lo e lhe indagou o motivo de seu gesto, quando todos reconheciam nele méritos mais que suficientes para ser um bom ministro.

- Admita-se que eu tenha as qualidades que Vossa Majestade me atribui. Mas eu não sou rico – requisito indispensável a um ministro que queira ser independente. Eu não quero sair do Ministério endividado ou ladrão!

Bem diferente do modo comum de pensar de tantos atores da política de todos os tempos, parece que muito mais atentos aos conselhos cínicos que Machado de Assis põe na boca e no coração de muitos de seus personagens. Estou pensando em “Suje-se gordo”, modelar conto machadiano de Relíquias de casa velha, em que fica explícito o conselho: o homem fora julgado e condenado por desviar irrelevante quantia de dinheiro. Isso não se devia fazer, porque a ninguém cabia sujar-se por quatro patacas. Quer sujar? Suje-se gordo! Ou então nos sábios conselhos dados ao filho pelo pai aproveitador da vida:

- Não tenhas ideias próprias, apega-te às frases feitas, às locuções convencionais, às fórmulas consagradas pelos anos, incrustadas na memória individual e   pública. Essas fórmulas têm a vantagem de não obrigar os outros a um esforço inútil. Tudo isso e muitíssimo mais estão na “Teoria do Medalhão”, em Papéis avulsos.

Bem diferente do modo de pensar do cândido Dr. Macedo, não?

 ACHO QUE SÓ EU LEMBRO

 

 Singular homenagem a um euclidiano

 Incomum  e comovente a homenagem prestada ao Prof. Márcio José Lauria, coordenador do Ciclo de Estudos  Euclidianos e presidente do Grêmio Euclides da Cunha, ausente por motivo de doença, na Semana Euclidiana de 1982.

Após a  cerimônia na Câmara Municipal, na tarde de 14 de agosto, os despojos de Euclides da Cunha deveriam ser removidos para o Museu Euclidiano, onde permaneceriam até o instante da inumação, no mausoléu recém-construído. Mas com a geral anuência, tomou forma a delicada  homenagem: já que o Prof. Lauria, que deveria ser o conferencista oficial da Semana, não pôde comparecer a nenhum passo das solenidades do traslado, que ao menos tivesse a oportunidade de ver as urnas que encerravam os restos de Euclides e de Quidinho.

À frente da residência  do Prof. Lauria, interrompeu-se o préstito. Foram cumprimentar o euclidiano temporariamente enfermo: o prefeito Dr. Celso Amato; o juiz de Direito Dr. José Roberto Vasconcellos; o presidente da Câmara, Prof. Roberto José Del Guerra; o diretor da Casa de Cultura, Dr. José Aloísio Rodrigues Corrêa; o presidente da Academia Paulista de Letras, Dr. Francisco Marins; o rio-pardense e euclidiano emérito  Dr. Honório de Sylos; o decano dos euclidianos de São José do Rio Pardo, Dr. Agripino Ribeiro da Silva; o presidente do Centro de Estudos Euclides da Cunha, de São Paulo, Dr. Oswaldo Galotti; o casal Eduardo Roxo Nobre, do Grupo Amigos da Cidade; a família de Euclides da Cunha, à frente Joel Bicalho Tostes e as netas do escritor: Sras. Eliethe da Cunha Tostes, Maria Auxiliadora da Cunha Lage e Norma da Cunha Póvoa; os Profs. Hersílio Ângelo, Célio Pinheiro e Émerson Ribeiro de Oliveira, do Ciclo de Estudos Euclidianos, além de outras pessoas participantes da Semana-82.

Na mesma noite, Márcio José Lauria Filho recebeu em nome de seu pai o diploma e a medalha alusivos ao traslado e um exemplar de Os Sertões autografado  pelos 14 descendentes de Euclides da Cunha.

 (Transcrito do Jornal da Região, de São José do Rio Pardo, página 10 da edição de 22 de agosto de 1982.)

 

23/09/2017
emelauria@uol.com.br

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