Mostruário de cultura inútil

 
O edifício Trevisan, sucessor de um sobrado.

 

 ·         Álvares de Azevedo, um dos grandes poetas do Romantismo brasileiro e autor de “Se eu morresse amanhã”, estudava na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo. Morreu aos 21 anos. Do mal do século, a tuberculose.

·         Assim como os três mosqueteiros eram quatro (Athos, Porthos, Aramis e d’Artagnan) , também a chamada “trindade dos poetas parnasianos” tinha quatro: Olavo Bilac, Vicente de Carvalho, Raimundo Correia e Alberto de Oliveira.

·         Caso talvez único nas literaturas de língua portuguesa: livros de dois autores terem o mesmo nome – Cartas de Inglaterra, tanto de Rui Barbosa quanto de Eça de Queirós.

·         Castro Alves, poeta  romântico (condoreiro), autor de “Navio negreiro” e de “Vozes d’África”, considerava-se um homem muito bonito. Tanto, que ao se olhar no espelho antes de partir para uma noitada boêmia, alertava: “Pais de família, tremei!” Morreu na flor dos 24 anos. De tuberculose. Teve um pé amputado, porque involuntariamente se deu um tiro de espingarda.

·         Cecília Meireles não  admitia ser chamada de poetisa. Achava o termo pejorativo, aplicável a mulheres que faziam  versos por diletantismo e não por necessidade de criação.  “Não sou alegre nem triste. Sou poeta.” é um verso seu.

·         Clarice Lispector, o mais enigmático nome feminino da literatura brasileira, nasceu na Ucrânia e foi criada em Recife. Tinha severas cicatrizes pelo corpo, causadas por um incêndio que teve início num cigarro que fumava na cama. Pegou no sono e acordou entre chamas.

·         É possível estabelecer-se  alentada série de comparações entre Os sertões, de Euclides da Cunha, e Vidas secas, de Graciliano Ramos.  Uma delas é que o livro de Euclides tem visão telescópica e o de Graciliano visão microscópica do mesmo tema: a submissão do homem ao meio em que vive.

·         Érico Veríssimo, escritor gaúcho de grande sucesso nos meados do século passado e pai de Luís Fernando Veríssimo, escreveu dois livros  sobre suas viagens aos Estados Unidos. O primeiro, com patrocínio oficial, é Gato preto em campo de neve e fala bem de quase tudo que o autor viu por lá. O segundo, com viagem por conta própria, é  A volta do gato preto  e fala mal de quase tudo que o autor viu por lá.

·         Fernando Pessoa, tido como o principal nome da literatura portuguesa do século XX, usava vários  outros nomes  (heterônimos), de acordo com as características de seus poemas. Um deles era Ricardo Reis. José Saramago, o único autor de língua portuguesa a conquistar o Prêmio Nobel, escreveu fantasioso romance,   O ano da morte de Ricardo Reis, em que esse heterônimo, como se tivesse vida própria,  se negou a morrer quando morreu o criador dele, Fernando Pessoa... Um espanto de imaginação.

·         João  Ubaldo Ribeiro, autor de Viva o povo brasileiro, de O sorriso do lagarto, entre tantos, teve primorosa educação na Alemanha porque sua mãe o levou para lá, casada em segundas núpcias com um alemão muito culto e mais novo do que ela. João Ubaldo e o padrasto nunca se deram bem. João Ubaldo verteu seus próprios livros para o inglês.

·         José de Alencar, de Iracema, o maior romancista brasileiro do século XIX, foi dos poucos inimigos declarados do imperador Pedro II. Apesar de ter sido ministro da Justiça, foi preterido numa lista tríplice da qual o soberano nomearia um senador, então cargo vitalício de livre escolha e não eletivo. “Sujeitinho desaforado!” – assim se referiu D. Pedro a Alencar.

·         Lusíadas quer dizer canto de louvor aos lusos. A grandiosa obra de Luís Vaz de Camões (1572) tem 8.816 versos decassílabos, distribuídos em 10 cantos, como se fossem capítulos. Os cantos são divididos em 1.102  estanças, como se fossem parágrafos. Cada estança tem 8 versos de 10 sílabas métricas cada um. Rimam entre si os versos 1,3 e 5; os versos 2,4 e 6; os versos 7 e 8.  Fácil, não?

·         Machado de Assis nasceu, viveu e morreu no Rio de Janeiro. Só fez uma viagem na vida: com problemas de visão, foi a Nova Friburgo (uns 200 quilômetros distante), onde ditou à mulher Carolina os capítulos iniciais de Memórias Póstumas de Brás Cubas, romance que inaugura sua melhor fase, a do realismo psicológico.

·         Monteiro Lobato, que conheceu a prisão durante a ditadura de Getúlio Vargas, assim comentou o ingresso do político na Academia Brasileira de Letras:  “ Ela tem 40 membros. Getúlio será o ZERO desse número”.

·         Muitos escritores de reconhecido valor jamais admitiram ser candidatos à Academia Brasileira de Letras, para não terem de cumprir o rígido ritual, que exige o pedido formal e individual de votos a cada acadêmico.

·         Nascido em Itabira do Mato Dentro (MG), Carlos Drummond de Andrade, por muitos considerado o grande poeta moderno do Brasil, durante bastante tempo foi  tido como  persona non grata em sua cidade natal. Tudo por causa destes versos finais do poema “Confidências de um itabirano”: Itabira é apenas um retrato na parede. Mas como dói! 

·         No verso camoniano  “Nos saudosos campos do Mondego”, do episódio de Inês de Castro em Os Lusíadas, para serem apuradas as dez sílabas métricas constantes em toda a vasta obra, a palavra saudosos precisa ser lida como tendo quatro sílabas: sa-u-do-sos, em que o ditongo au se torna o hiato a-u. Isso se chama “licença poética”,  ou em latim: poetis et  pictoribus omnia licet, -  aos poetas e pintores tudo é permitido.

·         O grande poeta Manuel Bandeira se  ralava de inveja (palavras suas) de um verso de Orestes Barbosa, autor da letra de “Chão de estrelas”, clássico da música popular brasileira: Tu pisavas nos astros, distraída.

·         Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, o nome completo do autor de belos sonetos e do poemeto épico “O caçador   de esmeraldas”, forma um verso alexandrino perfeito, até com a sexta sílaba forte, como manda a regra. Um predestinado, portanto.

·         Quando você reclama da homilia de quase meia hora de um padre qualquer, sempre é bom saber que alguns sermões do maior orador sacro da língua portuguesa, o jesuíta Antônio Vieira (1608 – 1697), beiravam duas horas de duração. É o caso do talvez mais famoso deles, o sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda.

 

17/01/2015
emelauria@uol.com.br

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