Horizontes estreitos
A bem da verdade, diga-se que apenas de vez em quando os horizontes do futuro do Brasil foram largos e nitidamente visíveis. Desde que me conheço por gente, quase sempre nuvens carregadas toldaram os céus do País, ora por isso, ora por aquilo. Parecia obrigação de nossos professores criar em nossas mentes uma imagem positiva a respeito da Pátria e da alta missão que lhe estava reservada no concerto das nações, como rezava uma frase feita. Bastou, porém, que avançássemos alguns anos em idade para logo percebermos que a realidade não era tão risonha assim e que a imagem do Brasil no mundo nada tinha de invejável, como nos asseguravam os otimistas de plantão. Educação e saúde eram nossos pontos fracos. Mas o Brasil podia nutrir esperanças. Tinha enorme superfície, clima favorável ao trabalho agrícola, riquezas inesgotáveis no solo, no subsolo, na fauna, na flora, boa mistura de raças, falta de preconceitos daqueles capazes de azedar qualquer futuro. Na verdade, apesar dos pesares, essas mesmas condições de riqueza e progresso se apresentam até hoje: o que mudou, mesmo, foi a atitude das pessoas com relação a seu deveres para com o próprio torrão natal. Parece que cada vez mais se concretiza a amarga lição contida em antiquíssima piada: quando da criação da Terra, um arcanjo teria comentado com Deus o tratamento diferenciado por Ele aplicado ao que seria o Brasil. Enquanto distribuía catástrofes para as mais diversas partes do nosso planetinha, Deus poupava abertamente este gigante pela própria natureza. Nada de rigores climáticos, nada de destruidoras tempestades, nada de terremotos catastróficos, nada de exageros nas secas e nas nevascas. Mas Deus explicou pacientemente a quem o acusava de injusto: - É. Mas você nem imagina o tipo de político que vou pôr naqueles lados... E assim parece estar sendo. Eta gentinha desqualificada essa que faz política, que administra mal, que corrompe, que pensa principalmente em vantagens pessoais, pouco se lixando para o chamado bem público, para a felicidade coletiva. É. Nossos horizontes, que tantas vezes se mostraram estreitos, nos dias que correm se fecharam ainda mais, dando-nos a triste impressão de que nos fizeram perder o trem da história. Tomara que não. Mas que vivemos um triste momento, disso não há dúvida. * Adhemar de Barros, Juscelino Kubitschek, Orestes Quercia, Paulo Maluf. O que é que esses políticos deixaram por herança em sua passagem pelo poder? Junto com inegável aura de popularidade, a fama de realizadores, ainda que a um preço altíssimo para o erário. Desses líderes populares, o único vivo é Maluf, devidamente protegido por renovável mandato eletivo, merecedor, portanto, de foro privilegiado, que o faz inalcançável pelo braço curto de nossa justiça caseira. Maluf internacionalizou suas ações e até uns meses atrás, achou prudente não desafiar a sorte; e assim deixou de passear pelo mundo todo, como era de seu costume. Contra ele, pesava um mandado de prisão, cumprível no instante em que pusesse os pés fora do Brasil. Agora não, teve seu nome excluído de seletiva lista de procurados pela Interpol. Já pode retomar, livre e lampeiro, suas reconfortantes vilegiaturas por Europa, França e Bahia, como se costuma jocosamente dizer. Chegou mesmo a comentar sua ficha internacional limpíssima e a exagerar o grau de sua santa inocência, a ponto de aspirar: “Agora só falta eu ser canonizado!” Ele merece! * Vi outro dia uma cena incomum na Praça Prudente de Morais, aqui pertinho de casa: um grupo de funcionários municipais, cada qual com seu alfanje, cortava a grama de castigados canteiros. Uns vistosos tufos de mato dominavam os muitos buracos existentes nas calçadas. Notei, com surpresa, que nenhum daqueles tufos era cortado. Perguntei a algumas pessoas que acompanhavam o trabalho: - Eles não arrancam o mato das calçadas? - Não. Dizem que não é serviço da Prefeitura, mas dos proprietários dos prédios com calçadas. Até pode ser que assim estabeleça uma lei municipal, mas essa falta de capricho com o aspecto geral da cidade pega mal, bem mal. É muito buraco, é muito mato, é muito desleixo com as coisas públicas. * Não há como não se pensar preocupadamente com o destino próximo e remoto de nosso Brasil. O que nos estará reservado para amanhã, para a semana que vem, para o próximo mês, para o fim deste ano? Só estreitamento de horizontes? Cresce a triste certeza de que eu, minha geração e tanta gente mais nova do que nós não voltaremos a viver dias menos complicados, com menos incompetência político-administrativa, com menos escândalos e com menos agressões à minguada riqueza nacional. Basta que qualquer órgão policial do País se disponha a procurar, que sempre achará uma nova prova do descalabro público. Ou como resume a antiga frase: A cada enxadada, mais uma minhoca. E das grandes, das tais minhocuçus!
16/04/2016 |