Aposentado? Coitado, quase sempre
Assistir à participação do secretário de Educação do governo paulista no programa “Roda Viva”, da TV Cultura, a 2 de novembro, foi experiência esclarecedora. Primeiro por se tratar de pessoa capacitada, séria, honesta, mas incapaz de resolver grandes problemas; segundo por não deixar a mínima dúvida quanto à impossibilidade de melhoria educacional ou da situação dos professores, quando menos nos próximos dez anos. Não vejo como levar a sério as manifestações que as associações de funcionários estaduais promovem de vez em quando, na doce ilusão de convencer o governador de plantão a não só atender algumas reivindicações como também, principalmente, a respeitar dispositivos constitucionais e estatutários que lhes garantem, no papel, reajustes anuais, paridade dos aposentados com o pessoal da ativa e outros sonhos de noites de verão. Recente pesquisa de âmbito mundial tira qualquer ilusão quanto a mudanças de atitudes dos governantes em relação às pessoas que, tendo cumprido suas obrigações funcionais e atingido determinada idade, esperam quase sempre com ansiedade o momento da aposentadoria como uma espécie de passaporte para o ócio com dignidade. A realidade, quase sempre, é frustrante em todos os sentidos, seja pela diminuição sensível de vencimentos, seja pelo rápido esquecimento que se abate sobre passados de lutas e de serviços relevantes à comunidade. A expectativa de vida está aumentando no mundo todo – o que é transtorno dos mais sérios para as fontes pagadoras de qualquer forma de previdência. Quem efetuou pesquisa em vinte e cinco países foi o HSBC, banco de expressão mundial. O tema foi “O futuro da aposentadoria” e contou com a participação de vinte e uma mil pessoas, entre quarenta e setenta e nove anos de idade. No Brasil foram anotadas mil opiniões. No estado de São Paulo, diversas entidades associativas e sindicais já estudaram o problema da previdência social e chegaram a conclusões que apenas confirmam as linhas gerais da situação dos aposentados no mundo todo: os servidores públicos paulistas convivem com incertezas, porque as reformas administrativas e previdenciárias traçaram novos rumos no sistema de custeio e pagamento dos proventos de aposentadorias e pensões. Pelo resultado desses estudos, os servidores perdem gratificações, adicionais e outros itens que integram o salário na atividade. Quando recorrem à Justiça e têm ganho de causas, o comum é esperarem por anos, por décadas, o pagamento dos precatórios. Muitos morrem às portas da miséria, mesmo tendo substanciais quantias para receber dos órgãos públicos. Um servidor de setenta e um anos, considerando a morosidade no pagamento de precatórios, calculou que o seu só lhe seria pago quando tivesse cento e quatro anos de idade... E o pior: os poucos reajustes de vencimentos dos servidores na ativa não lhes são repassados. Recente notícia jornalística informa que os professores aposentados paulistas não contribuem suficientemente para a previdência, de tal modo que todo mês o Governo precisa colocar dinheiro para a complementação das folhas de pagamento. De nada adiantarão, portanto, as reclamações e as frases de efeito, como a de uma presidente de entidade classista que grita com toda a força dos pulmões: “Estamos escancarando a verdade e mostrando que não exageramos ao dizer que estamos na lata do lixo”. Não bastasse essa míngua de pagamentos, ainda muitos aposentados são forçados por familiares a lançar mão de expediente perigosíssimo e de efeitos devastadores: socorrer-se do crédito consignado, pelo qual ficam devedores de entidades financeiras que lhes concedem, gostosamente, empréstimos a juros escorchantes, comprometedores de até cinquenta por cento dos vencimentos mensais. Não é segredo para ninguém a vexatória situação vivida por professores da rede pública paulista que têm de recorrer aos préstimos de associações de classe, como entre nós a ARPA, e mais abrangentemente a APAMPESP, sem as quais não teriam nem como tratar com decência de seus problemas de saúde. O IAMSPE, Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual, há muito deixou de ser o modelar prestador de serviços à classe. A verdade é que, nesta nossa cidade, desinstalou-se o setor de atendimento, que durante anos foi invejável. Hoje, se não fosse o meritório empenho da ARPA (Associação Rio-Pardense de Professores Aposentados) em manter plano coletivo de assistência médico-hospitalar com o SAVISA, grande parte dos professores aposentados teria de se contentar com o atendimento mínimo do SUS, porque o poder aquisitivo da classe do magistério público está em franca deterioração.
De tudo tiram-se algumas conclusões inevitáveis: · Funcionário aposentado não está nos planos de nenhum governo, todos eles empenhados num esforço de redução de gastos, reajuste de salários aos padrões do mercado e terceirização de serviços. Aposentados e pensionistas são apresentados, nesse quadro inovador, apenas como números de despesas. Quanto menos, melhor. · É indispensável preparar os funcionários atualmente na ativa para viverem menos traumaticamente a chegada de sua aposentadoria com todas as decorrências de ordem econômica, psicológica e social. · Especialistas recomendam que todos devem, desde logo, pensar seriamente no assunto, interessando-se por programas de pré-aposentadoria e tomando cuidados com atitudes e ações que podem criar imagens desfavoráveis à sua própria autoestima. Daí a necessidade de se esmerar na aparência física, preparar-se espiritualmente para o desligamento do meio em que permaneceram por muitos anos, descobrir projetos que os preparem como cidadãos, a participar de atividades comunitárias, dar atenção à saúde e, principalmente, deixar que filhos e netos resolvam seus próprios problemas financeiros. · Melhor do que tudo, porém, é guardar, por anos e anos, pequenas economias que venham a constituir a tábua de salvação desses desastres causados pela má remuneração após a cessação dos trabalhos. É unânime a opinião de que muito da manutenção ou queda imperceptível de padrões sociais e econômicos dos funcionários está diretamente ligada à existência do que, de modo geral, se pode chamar previdência privada. · Acreditar em situações de melhoria promovidas por órgãos estatais é ilusão das mais rematadas, comparável a acreditar em contos de fada, ou a pensar em resolver apertos financeiros ganhando na megassena. E.T. – A Prefeitura de São Paulo anuncia agora que estabelecerá um máximo de 4 mil e poucos reais para pagamento de seus aposentados e que criará uma espécie de previdência privada para seus funcionários.
07/11/2015 |