De ontem e de hoje

 

Um discurso que ninguém ouviu

O amigo Vanildo Costa, o capitão, meu aluno de longínquas eras  no Ginásio Rio-Pardense, entrega-me  cópia  xerográfica  do discurso que um falecido e estimado cidadão  iria ler, quando lhe fosse transmitido pela segunda vez o cargo de prefeito municipal. E por um desafeto inconciliável.

Iria ler, porque Vanildo, com tato e autoridade moral, o demoveu de tornar pública  uma pequena e contundente peça  que, quando menos, iria pôr gasolina na permanente fogueira política do  município.

Ao invés de uma transmissão tensa, carregada, sujeita mesmo a xingamentos, tapas e pescoções, além de intermináveis desdobramentos futuros ao estilo de verdadeira vendetta, o que se viu, graças ao poder de persuasão de Vanildo, foi um ato público civilizado e apaziguador: terminada a rápida solenidade, o prefeito recém-empossado e sua senhora acompanharam o antigo prefeito e senhora até ao local  de onde um carro os levaria de volta ao triste mundo dos ex. Despediram-se formal e polidamente (por dentro, a mútua vontade de se esganarem), dando aos espectadores uma ideia falsa, mas esperançosa, de que fazer política não significava, necessariamente, criar inimizades rancorosas.

Começa assim a peça oratória:

Envolvidos na luta, deparamos com os  infalíveis detratores. Se não pela ignorância ou por malícia, mas certamente pela fraqueza e má-fé, lançaram infâmias e calúnias contra meu nome e o de meus companheiros de luta. Nem pouparam a nomeada de minha família... Eis a religião que seguem: denigrem o próximo de dia, e à noite apregoam a caridade. Uma autêntica hipocrisia. Mas essa claque não é nova. Em tempos idos, Cristo já os classificava de  “sepulcros caiados” .

Forte, não? Ainda bem que a catilinária, redigida sabe-se lá a quantas mãos e no calor da hora, permaneceu inédita por mais de meio século. Ainda bem que um Vanildo Costa pôde desarmar espíritos  e evitar tragédias quase anunciadas.

 

Um  autêntico gesto euclidiano

Geraldo Majella Furlani, o professor de Geografia de tantas gerações em Casa Branca, Vargem Grande do Sul e São José do Rio Pardo, num dia do final de maio, esteve na sede do DEC, no Tartarugão, para entregar a Lúcia Vitto, diretora de Cultura e da Casa Euclidiana, um presente de alto valor: um DVD  em que estão reunidas todas as  fotos que  tirou em Canudos e  arredores.

Sempre apreciei as exposições de Majella nos Ciclos de Estudos Euclidianos, porque modelares pela seriedade dos assuntos tratados e pela didática do autor. Eu ficava admirado com a aplicação e com a memória de Majella: à medida  que  ele exibia suas fotos, ilustrava-as com as frases euclidianas referentes a plantas, minerais e paisagens do sertão baiano ali retratados. Tudo  rigorosamente certo.

Como o tempo é corrosivo por natureza, esse DVD oferecido à Casa Euclidiana, que poderá ser reproduzido indefinidamente, garantirá aos estudiosos  fácil acesso a um conjunto de fotos que, com os respectivos textos retirados de Os sertões,  comovem não só pelo rigoroso informe científico, mas pela comprovação do alto teor poético com que Euclides conseguiu impregnar a primeira parte de seu livro (“A terra”),  que mereceu de críticos e leitores menos sensíveis à beleza textual  a errônea classificação de difícil, quando na verdade é exata e superiormente elaborada. Euclides tinha  perfeita intuição do possível consórcio entre a ciência e a arte, como  defende no prefácio modelar que escreveu para Poemas e canções, de  seu amigo Vicente de Carvalho  (1907).

Foram, pois, merecidas as palmas com que Lúcia e eu, espontaneamente, saudamos a beleza da apresentação do trabalho de Majella.

 

O poder das pesquisas

Encontro no material que o capitão Vanildo recentemente me ofereceu,  uma rara confissão  prévia de derrota. Candidato a prefeito e seu  vice lançam manifesto ao povo rio-pardense nos seguintes termos:

Honrados com a indicação de nossos nomes para a disputa do pleito sucessório municipal, aceitamo-la com o elevado espírito de servir à coletividade e à nossa gente.

Por razões que já são do conhecimento público, não temos condições de continuar a disputa e, por isso, afastamo-nos da luta.

Nesta oportunidade queremos agradecer a todos aqueles que nos emprestaram o seu decidido e sincero apoio.

Desejando aos que serão eleitos os nossos votos de feliz administração, registramos nossa confiança no progresso de nossa terra.

 

Motivo de tão rara desistência, explicado em outro boletim:

“Pesquisa de opinião pública efetuada por equipe de prestígio internacional realizada há pouco mais de vinte dias do pleito destruiu uma bela esperança, dando esmagadora vitória ao adversário cuja derrota exigiu tantos sacrifícios.  As razões invocadas pelos eleitores para justificar o seu voto são aquelas mesmas que julgávamos sepultadas. Curvamo-nos ante  o veredicto da soberania popular.”

 

O herói doméstico e as opiniões divergentes

Republiquei, depois de quatro anos, um texto considerado “muito triste” por uma leitora que ficou  tempos  longe daqui e agora volta para curtir a aposentadoria e as boas amizades.

Diversos outros leitores se manifestaram de forma diferenciada, como se pode ler em seguida.

 

De uma rio-pardense muito atenta:

Viche! Que coisa incrível esse rapaz.

Fiquei veramente emocionada com a força de vontade, e mais ainda, com a FÉ dele.

Isto é o que se pode chamar de SUPERAÇÃO, não?

Acho que você fez muito bem em escrever sobre ele, pois pessoas assim não aparecem a toda hora, muito pelo contrário ---- a grande maioria estaria até hoje revoltada com Deus e o mundo, sem falar na esposa, que não aguentou ver tanto sofrimento e foi-se embora, deixando-lhe as filhas pra criar, o que, para ele, se tornou sofrimento maior, pois, embora esteja se virando bem (como ele mesmo lhe disse), deve sentir não poder fazer mais por elas.

Como diria meu avô Luís: "bela roba" essa esposa, não?

 

De outra rio-pardense muito crítica:

Nada contra esse senhor. Mas para cada caso de desprendimento masculino, há mil de     sacrifícios femininos. Você está intimado a escrever uma crônica falando de heroínas domésticas.

 

De uma paulistana muito sensível:

Muito bonita a vida desse seu companheiro de sauna. Acontece nas melhores famílias...

 

De uma rio-pardense campineira:

Que estória de superação! Realmente o PMG é um homem  raro, que está dando aos filhos um exemplo de vida.

 

De um casal de Piracicaba:

Diga a ele que estamos colocando-o em nossas orações.

 

De uma professora mineira:

Esse é o cara! Belíssimo exemplo de vida!

 

De um advogado militante:

Não seria o caso de se acionar o motorista do caminhão ou a firma para a qual o atropelador trabalhava?

(Ele não havia percebido que o texto era de 2007)

 

04/06/2011
emelauria@uol.com.br)

 

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