Recanto
Euclidiano
(fotos: Sicca Imagem)
Recanto
Euclidiano
Vasta
área
ajardinada e arborizada,
próxima à
ponte
metálica,
abriga
um
conjunto de
monumentos,
o
mais
importante
deles a
cabana
de
sarrafos
e
zinco
que serviu
de
escritório a
Euclides da
Cunha,
desde 1928
protegida
por
redoma de
vidro
que permite
ampla
visão da
preciosa
relíquia
histórica,
tombada
como
monumento
nacional.
Uma peanha de
granito
rosa,
popularmente
conhecida
como
herma, ostenta
um
medalhão
em
bronze de
Euclides da
Cunha, doado
à
cidade
pelo
jornal
O
Estado
de S. Paulo,
em 1918.
Em
1982 foi
solenemente
inaugurado o
Mausoléu
que
abriga os
despojos de
Euclides da
Cunha e de
seu
filho de
mesmo
nome,
trazidos do
cemitério
São João
Batista, do
Rio de
Janeiro,
por
expresso
desejo da
família do
escritor,
como
reconhecimento
ao
permanente
esforço da
cidade na
manutenção
da
memória e na
divulgação da
obra
euclidiana. O
formato do
Mausoléu
lembra a Matadeira,
nome
que os
habitantes
de
Canudos
deram a
um
canhão
que
bombardeava o
arraial de
Antônio
Conselheiro
e
seus
seguidores.
(Prof. Márcio José Lauria)
Herma assim, só aqui
Não são poucos os casos de um vocábulo ou
expressão assumirem um sentido todo especial, em dado local e em dada época.
Aqui em São José do Rio Pardo, algumas
pessoas, geralmente idosas, ainda chamam o cemitério de chácara do padre.
Para elas, ir para a chácara do padre é um dos muitos eufemismos com que
designam a inevitável contingência de morrer.
Historiadores atentos hão de ter a chave de
por que, desde o começo do século, ocorre esse fenômeno semântico. Nem me atrevo
a entrar na seara, que não é minha.
Emprego mais geral e certamente mais
duradouro envolve o termo herma. Só aqui se constroem frases assim:
“Vamos dar um passeio na herma?”
“Como estão floridos os canteiros da
herma!”
Ninguém, afinado com nossas coisas, terá
dificuldade no entender que herma traduz o aprazível lugar à beira do rio
Pardo, que tem uma casinha protegida por redoma; tem ainda mangueiras, uma
paineira, bancos, espelho d’água, flores e vista privilegiada de uma bela ponte
metálica. Herma compreende todo o recanto euclidiano, mas não inclui o
mausoléu, de construção recente e personalidade própria.
No entanto, bem diferente é o sentido
dicionarizado do substantivo. Direi em resumo que herma é busto esculpido
de forma tal, que o peito, as costas e os ombros são cortados em planos
verticais. Há documentação do seu emprego em português desde o século XVII.
Origina-se de herma, forma latinizada do grego hermes, do mitônimo
Hermes, filho de Zeus e Maia, que era o mensageiro dos deuses e protetor dos
viajantes.
De
início, herma referia-se apenas a estátuas de Hermes (ou Mercúrio),
incluídos os marcos de pedra quadrados que mostravam os caminhos, porque esses
marcos eram rematados em um meio-corpo, ou cabeça de Mercúrio.
No Brasil, herma passou ainda a
significar qualquer meio-busto esculpido, ou estátua aplicada a um plinto – peça
quadrangular que serve de base a um pedestal ou a uma coluna.
Verdadeiramente, não há no recanto
euclidiano nem meio-busto esculpido, nem estátua aplicada a um plinto; apenas
uma peanha de granito na qual (e não sobre a qual) se apóia o medalhão de bronze
com a efígie de Euclides.
Pelo que se vê, só com a máxima boa vontade
se pode afirmar que existe uma herma de Euclides da Cunha em São José do Rio
Pardo. Mas o fato é que, à parte essas sutilezas escultórias que procurei
sintetizar, todos se referem à herma de Euclides, muitos vão lá até namorar,
pouquíssimos ainda suportam as “romarias” de todo 15 de agosto e ninguém dará
importância maior a questões como esta aqui levantada por mim. Muito menos ao
nome da figura de linguagem que constitui no uso da parte (o monumento) pelo
todo (seus arredores também): metonímia.
Sabe-se lá por quem e quando foi aplicada
com tão pouco rigor a palavra herma à escultura de homenagem a Euclides. Não
obstante, o termo ficou e ficará vigendo por aqui, numa acepção não abrigada por
dicionário algum.
Herma, mesmo, ganhou do povo o capitão
Mário Rodrigues, prefeito de muito prestígio, que morreu há uns setenta anos:
aquela estátua, meio-corpo, sem braços, que por algumas décadas ficou defronte à
Prefeitura velha, envolta por uma pérgula. Agora voltou a seu lugar primitivo,
nas imediações da Escola Tarquínio Cobra Olyntho, de onde saiu para dar espaço
ao 2º grupo escolar da cidade.
Surpreende-me uma súbita lembrança que vem
lá de antanho: em criança, cheguei a brincar na herma do capitão Mário, o
que quer dizer que, muito certamente pela influência do sentido já dado à
palavra com relação ao recanto euclidiano, a expressão “herma do capitão Mário”
referia-se não ao monumento em si, mas a toda a sua adjacência, o jardim inteiro
no qual o meio-busto se inseria.
Quando mudaram o lugar da estátua, esta não
levou consigo a exata denominação de herma, simplesmente porque na cidade
o vocábulo significava outra coisa, estando em definitivo ligado a Euclides e à
peculiaridade do ermo em que o escritor trabalhou na ponte e no seu grande
livro.
Mais hermas como prescrevem os dicionários?
Vamos lá: a do coronel Marçal Nogueira de Barros, defronte à Prefeitura nova: a
do Soldado Constitucionalista, nas proximidades da Câmara; a do coronel Alípio
Luís Dias, à entrada da Santa Casa. Também na chácara do padre há pelo
menos mais uma, bem visível, de mármore branco.
Talvez poucos saibam que foi do cemitério
que o então prefeito Lupércio Torres, com a anuência dos descendentes, tirou a
herma do coronel Marçal, também em mármore branco, que antes encimava a
sepultura do co-fundador desta nossa original cidade.
(Texto redigitado em 2004 pelo Prof. Lázaro Curvelo
Chaves
Do livro “Nós – Os Outros – Alguns Intrusos” - 1996
- do Prof. Márcio José Lauria)
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